No suplemento "MilFolhas" da edição de ontem do jornal Público, Rita Pimenta propõe um conjunto de livros para os mais novos. Pelo seu interesse didáctico, aqui a reproduzo:
"A qualidade dos textos ou das imagens, o sucesso no mercado ou a evocação do Natal foram os critérios que ditaram as escolhas que se seguem. Uma tarefa difícil perante a loucura temporária que atinge o sector editorial da área infanto-juvenil nesta época. A melhor opção, contudo, é levar as crianças às livrarias e ir observando os seus gostos. Pôr alguém a ler é sempre uma boa prenda de Natal - para quem dá e para quem recebe.
Kô e Kó, Os Dois Esquimós - Sobre este livro, aconselho esta leitura adicional!
Autor Pierre Gueguen
Tradutor Joana Cabral
Ilustrador Maria Helena Vieira da Silva
Editora Gótica
36 págs., 30 euros
Imaginada pela pintora Vieira da Silva, esta história de dois esquimós que procuram conhecer o mundo foi escrita pelo poeta francês Pierre Gueguen. Editado pela primeira vez em França, no ano 1933, da obra original "Kô e Kó" já só existem dois exemplares conhecidos - um que se encontra na Biblioteca Nacional (em Lisboa) e outro na Galerie Jeanne-Bucher (em Paris). Um trabalho que merecia ser reeditado pela sua beleza e força imaginativa, tanto das palavras como das imagens. O texto aparece em manuscrito, numa recriação de David Laranjeira a partir da grafia de Vieira da Silva. No final do livro, encontram-se duas pranchas com figuras para recortar, podendo assim transformar-se a obra num conjunto de belos cenários. Uma edição de quase luxo que faz lamentar ainda mais que a frase de arranque da narrativa esteja mal pontuada (apetece soprar a vírgula que separa o sujeito do predicado).
Como me Tornei Marc Chagall
Autor e ilustrador Bimba Landmann
Tradutor Leonor Bragança
Editor Livros Horizonte
36 págs., 15,66 euros
Com base na autobiografia do pintor russo, o livro "Como Me Tornei Marc Chagall" conta as dificuldades de alguém que não se enquadra nos padrões vigentes da sua época e cultura. Contrariando os planos, bem intencionados, dos pais, Chagall viria a ser o que sempre quis, um artista famoso. Saiu de Vitbesk, atravessou as duas guerras mundiais e viu o seu trabalho penalizado (e nalguns casos destruído) por ser de origem judia. A obra inspira-se no livro "A Minha Vida" e revela como o seu nome genuíno era Moshe Segal. A ilustradora italiana Bimba Landmann imprime uma atmosfera quente e misteriosa ao texto, num conjunto de imagens que sugerem a própria pintura de Chagall. Natural de Milão (1968), Bimba Landmann frequentou a Academia de Belas-Artes daquela cidade e participou sempre em vários cursos de ilustração. A partir de 1988 dedicou-se a tempo inteiro à ilustração de livros para a infância, colaborando esporadicamente com a imprensa. Entre as distinções que recebeu, destaque para o prémio, no Japão, do "Picture Book Award", para o trabalho "Um Rapaz Chamado Giottto" (editado pela Livros Horizonte em 1999). Nesta obra que propomos não se reproduzem originais de Marc Chagall, "por questões relativas a direitos autorais". É pena.
Contos
Autor Hans Christian Andersen
Ilustrador Nikolaus Heidelbach
Tradutor Maria Nóvoa
Editor Círculo dos Leitores
378 págs., 36,90 euros
No ano em que se assinalou o bicentenário do nascimento de Hans Christian Andersen, foram muitas as edições que se fizeram dos seus contos. Neste álbum, histórias como "O Patinho Feio", "O Fato Novo do Imperador" ou a "Sereiazinha" têm o mérito de ser acompanhadas por ilustrações do artista plástico Nikolaus Heidelbach, que já venceu o Prémio Literatura Juvenil Alemã pelo conjunto da sua obra. Alguns dos contos menos conhecidos do escritor dinamarquês Hans Christian Andersen integram esta colectânea, como a "A Agulha de Passajar" ou "Uma Grande Dor". Um livro de clássicos infantis bom para os adultos.
Conversas com Versos
Autor Maria Alberta Menéres
Ilustrador Rui Castro
Editor Edições ASA
78 págs., 10,50 euros
Poesia para crianças que pode ser dita "em voz mais alta ou segredada". Palavras de uma autora que não se pode deixar de nomear quando se fala de literatura para a infância. Maria Alberta Menéres continua aqui a mostrar que é sempre possível pôr uma pedra a falar ou um búzio a trazer-nos a voz do mar. Com mais de 60 livros escritos para crianças (contos, BD, novela, teatro e poesia), a autora dirigiu o departamento de programas e infantis e juvenis da RTP de 1974 a 1986, ano em que recebeu o Prémio Calouste Gulbenkian da Literatura para Crianças "pelo conjunto da sua obra e pela manutenção de um alto nível de qualidade". Continua a merecê-lo.
As ilustrações de Rui Castro são divertidas e interagem com o texto de modo eficaz, escondendo ou desvendando pormenores dos poemas que acompanha.
A Ilha das Palavras
Autor José Jorge Letria
Ilustrador Madalena Ghira
Editor Oficina do Livro
32 págs., 14 euros
Em busca da Ilha das Palavras lança-se José Jorge Letria, autor nacional com uma produção incomparável de livros para crianças e jovens. "Fui à procura dos atlas e dos livros de Geografia que tenho em casa (...), mas devo já confessar que não encontrei qualquer referência a essa misteriosa ilha", diz-se na história. Será com a ajuda de um papagaio que o narrador conseguirá visitar o lugar em que todas as palavras nascem e onde habitam autores como Alexandre O" Neill, Cesário Verde, Camões ou Sophia. "Agora, quando me faltarem as palavras de que preciso para nomear as coisas e os sentimentos que verdadeiramente contam na vida das pessoas, arranjo um barco e faço-me ao mar, na esperança de voltar a encontrar essa ilha que é diferente de todas as outras." De parabéns estão as aguarelas de Madalena Ghira, que ajudam a entrar numa envolvente atmosfera onírica. Parte do lucro das vendas deste livro, destinado a miúdos já treinados na leitura, irá para a Fundação do Gil.
A História do Hidroavião
Autor António Lobo Antunes
Ilustrador Vitorino
Editor Dom Quixote
30 págs., 13,3 euros
"Como é Lisboa, Artur?", quer saber o cego de óculos de mica, "muito direito, atento com os ouvidos que é como os cegos vêem". O homem que está ao seu lado, em Cabo Ruivo, ao pé dos fumos da Siderurgia, "morou quarenta e sete anos em África, a trabalhar de motorista de camião ao serviço dos holandeses dos diamantes, e custava-lhe habituar-se a uma terra de frio onde ninguém o conhecia".
Quem irá responder à pergunta será o indiano das "gasosas", "a lembrar-se do seu café de dois andares de Moçamedes": "Lisboa é esta infelicidade, amigo."
A saudade de África é o centro de uma narrativa crua que dá a conhecer uma amizade silenciosa, com vista para um hidroavião que se enferruja com o tempo. Como o ânimo. António Lobo Antunes cria um texto de emoção contida, a que se junta o trabalho expressivo do músico e compositor Vitorino. Para leitores jovens e adultos.
O Planeta Branco
Autor Miguel Sousa Tavares
Ilustrador Rui Sousa
Editor Oficina do Livro
90 págs., 15 euros
Quase tudo se passa dentro de uma nave espacial, a Ítaca-3000, que procura o planeta Orizon S-3, onde os homens acreditam existir água. Três tripulantes vão viver uma situação estranha que nunca poderão recordar. Desviada inexplicavelmente da sua rota, a Ítaca-3000 é levada até ao Planeta Branco. Aí, é dito aos astronautas (que em poucas horas envelhecem muitos anos) que são os primeiros humanos vivos a ali entrar. Lydia, Baltazar e Lucas ficarão também a saber que a morte "não é o fim de tudo o que existe". O senhor de branco explica-lhes ainda que "há muito mais coisas no Universo do que os vivos imaginam".
Este é o segundo livro de Miguel Sousa Tavares para a infância. Embora a narrativa não cative de imediato o leitor, com o avançar das páginas vai aumentando a vontade de o prosseguir. O respeito e a preocupação com o planeta Terra estão presentes, assim como a valorização da relação entre as pessoas. Quanto ao que "esclarece" sobre o que se passa com quem morre e chega ao Planeta Branco, o melhor é ler o livro. Ilustrações pobres para um tão rico universo.
Anedotas de Animais Ilustradas
Autor Tiago Salgueiro
Ilustradores Elsa Navarro, José M. Saraiva e Rui Castro
Editora Gailivro
28 págs., 8,90 euros
Uma recolha e adaptação de anedotas de animais pela mão de Tiago Salgueiro. Umas são curtas e outras nem tanto, algumas bastante patetas mas quase todas divertidas. A escolhida para pôr na capa foi a seguinte: "O que diz um ouriço-cacheiro ao chocar com um cacto? - És tu, mãe?" A originalidade desta edição é a de reunir três ilustradores diferentes. Apesar de cada um ter um estilo próprio e facilmente identificável, os trabalhos de Elsa Navarro, José M. Saraiva e Rui Castro convivem bem uns com os outros. Todos são expressivos e coloridos, respeitando o leitor-observador e dando-lhe pistas para que consigam vislumbrar o desfecho de cada uma das adivinhas.
A Galinha Que Cantava Ópera
Autor Luísa Costa Gomes
Ilustrador Pierre Pratt
Editor Dom Quixote
26 págs., 12,5 euros
Uma autora que não costuma escrever livros para crianças assina este "A Galinha Que Cantava Ópera". Com os animais como protagonistas, Luísa Costa Gomes cria uma série de histórias em verso, usando um vocabulário rico e até inesperado. Com ritmo e vivacidade, as narrativas fluem com sentido de humor e ironia, que os adultos entendem e as crianças pressentem. De entre as várias histórias, destaque para a "Coitada da cegonha", é deliciosa, embora cruel.
As pinturas de Pierre Pratt continuam a enriquecer todas as histórias que se propõe ilustrar, com um estilo que facilmente o "denuncia". As crianças a quem o Mil Folhas mostrou o livro elegeram como melhor ilustração a que acompanha o texto intitulado "O polvo".
Atlas do Mundo
Coordenação Margaret Hynes
Consultor geográfico Roger Bullen
Tradutor Carina Cunha e Natanael Ferreira
Pesquisa de Imagem Cee Weston-Baker
Editora Edições ASA
130 págs., 24,90 euros
Para jovens, eis uma obra que não é de literatura, mas de outro tipo de conhecimento. Este "Atlas do Mundo" é um bom instrumento de consulta, com uma cartografia clara, a que se junta um CD-ROM com mais de 40 mapas e estatísticas actualizadas. Saber localizar países ou outros pontos geográficos, perceber como nascem as montanhas ou porque correm os rios é imprescindível para que os mais novos comecem a conhecer o mundo. E a gostar dele. Uma certa ignorância territorial e geográfica pode ir sendo combatida com livros como este. Bem organizado e legível.
Paisagem com Trenó e Neve ao Fundo
Autor Vergílio Alberto Vieira
Ilustrador Anabela Cotrim
Editor Campo das Letras
32 págs., 9,45 euros
Como é habitual, encerramos o grupo de escolhas com livros sobre o Natal. Este é de um autor que diz ter passado a vida numa espécie de "guerrilha aberta entre o cristianismo e o Vaticano". Palavras de Vergílio Alberto Vieira na apresentação deste livro, nos Encontros Luso-Galaico-Franceses que decorreram no Porto, em Novembro. "Paisagem com Trenó e Neve ao Fundo" acaba por ser um conto bíblico, em que se mistura o presépio com um trenó cheio de crianças a convidar Jesus para uma viagem sem destino. No final da história, saúda-se o Inverno com um poema que começa assim: "Vem de longe, o caminheiro/ o frio traz no bornal. /Caminhou o dia inteiro, / Do caminho nem sinal." Autor de inúmeros títulos para crianças (e para os outros), parece ser na poesia que melhor se sente. Anabela Cotrim, estreante na área de ilustração de livros infantis, cumpre bem a missão de criar um ambiente de magia e ternura, deixando o pequeno leitor embevecido.
O Natal Especial da Rena Rubi
Autor Stella Gurney
Tradutor Vítor Rocha
Ilustrador Sharon Williams
Editor Nova Gaia
28 págs., 14 euros
Um livro típico de Natal, com imagens cintilantes e em que se fala dos preparativos dos duendes e das renas para que os presentes consigam chegar a todas as crianças na tão esperada noite. Desta vez, a rena Rubi irá estrear-se na distribuição das prendas. Como é a mais pequena do grupo, tem dificuldade em manter o ritmo e velocidade das suas companheiras e acaba por perder o fôlego. O Pai Natal pede-lhe então que volte para trás. "Desculpa, Rubi. Eu sei que fizeste o teu melhor." Desolada, Rubi regressa a casa e encontra uma oferta que ficou esquecida. O resto da história não contamos, pois acreditamos que pôr alguém a ler é uma boa prenda de Natal."
OBS. Os links são da minha responsabilidade.