Pelo seu manifesto interesse pedagógico, cito ainda Rita Pimenta, a partir das páginas do suplemento "Mil Folhas" da edição de hoje do jornal Público:
"A zanga dos pinguins
"Hoje de manhã, a minha mãe gritou comigo, e eu fiquei desfeito." A partir desta frase (e circunstância), Jutta Bauer cria uma narrativa comovente e expressiva sobre o efeito que os conflitos têm em quem os protagoniza. Crianças ou adultos.
Tomando à letra a palavra "desfeito", a autora e ilustradora conta como o pinguim filho sentiu a sua cabeça deslocar-se para "junto das estrelas", o seu corpo perder-se "por entre as ondas do mar", as asas voarem e só pararem "na selva", o bico alcançar "o cimo de um monte", a cauda perder-se no meio da cidade e as patas correrem sem parar até alcançarem o deserto.
"Quando a Mãe Grita..." foi criado depois de um outro livro da escritora alemã, também muito interessante e original, "A Rainha das Cores" (editora Cobra Laranja, 2002). Em ambos, Jutta Bauer joga com o conflito, o sofrimento e a reconciliação, pois "acredita que para se resolver desentendimentos há que passar primeiro pela tristeza e pela dor", disse em entrevista à revista espanhola "Babar", durante as Jornadas Europeias do Livro Infantil e Juvenil (Madrid, 2005).
No livro "A Rainha das Cores" (premiado na Alemanha pela ilustração), uma rainha a preto e branco tem uma grave desavença com a cor amarela, o que levou a uma mistura violenta de todas as cores suas súbditas. Um imenso cinzento acabará por invadir a paisagem e será o choro da monarca que trará a solução ao conflito e levará cada cor a retomar o seu lugar. Mais que um final feliz, dá-nos um desfecho colorido. A autora associa a identificação de cada cor ao reconhecimento que as crianças terão de fazer de si próprias e também à sua aceitação como indivíduos por parte dos pais, ou outros adultos que delas cuidem.
A influência
dos desenhos animados
Há uma simplificação artística nos trabalhos de Jutta Bauer, com a presença de poucos elementos mas cujas formas e posições imprimem um dinamismo muito forte, nalgumas imagens quase hipnótico. Ao leitor chega a dar a sensação de que as figuras se movem de umas páginas para as outras, sobretudo no caso da "Rainha das Cores". Esta técnica obteve-a da experiência de produção de desenhos animados, em que tinha de repetir infinitas vezes a mesma forma mas em atitudes e enquadramentos diferentes, optando assim por reduzir as personagens a traços elementares.
O livro "Quando a Mãe Grita..." surge mais "estático", sendo no entanto muito relevante e eficaz a ligação entre o texto e imagem, como se um não pudesse existir sem o outro. A separação das duas linguagens (a visual e a literária) decerto empobreceria a compreensão e a fruição da narrativa.
Na entrevista à "Babar", revista de literatura infantil e juvenil (http://revistababar.com), Jutta Bauer desmonta o seu método de trabalho: "Às vezes surgem-me primeiro umas palavras que me levam até a uma imagem, ou vice-versa. E assim vai acontecendo até que termino o livro. Até hoje nunca escrevi um texto completo a que tenha juntado logo a ilustração, muito menos o inverso. Nunca de um conjunto de ilustrações me surgiu um texto. Geralmente crio um "story board" como o que se usa para os desenhos animados: numa série de pequenas janelas vou registando a sequência das ilustrações; depois, vou completando à medida que o texto ou outras imagens me vão surgindo. De início, escrevo e desenho tudo muito pequenino e, quando o conjunto está terminado, retoco algumas partes dos dois elementos."
A autora, também cartoonista, nasceu em Hamburgo em 1955 e acredita que "as histórias são como jarros, oferecem uma forma, mas todos os leitores - pouco importa se novos ou velhos - os enchem com as suas próprias experiências e histórias pessoais".
Com os pinguins, há de novo um conflito que se resolve: "A mãe, depois de ter gritado, tinha ido ao encontro de cada parte de mim e, com paciência, linha e agulha, já tinha unido quase todas, só faltavam as pernas." Por fim, disse a palavra mágica que nem todos os adultos conhecem: "Desculpa.""
"A zanga dos pinguins
"Hoje de manhã, a minha mãe gritou comigo, e eu fiquei desfeito." A partir desta frase (e circunstância), Jutta Bauer cria uma narrativa comovente e expressiva sobre o efeito que os conflitos têm em quem os protagoniza. Crianças ou adultos.
Tomando à letra a palavra "desfeito", a autora e ilustradora conta como o pinguim filho sentiu a sua cabeça deslocar-se para "junto das estrelas", o seu corpo perder-se "por entre as ondas do mar", as asas voarem e só pararem "na selva", o bico alcançar "o cimo de um monte", a cauda perder-se no meio da cidade e as patas correrem sem parar até alcançarem o deserto.
"Quando a Mãe Grita..." foi criado depois de um outro livro da escritora alemã, também muito interessante e original, "A Rainha das Cores" (editora Cobra Laranja, 2002). Em ambos, Jutta Bauer joga com o conflito, o sofrimento e a reconciliação, pois "acredita que para se resolver desentendimentos há que passar primeiro pela tristeza e pela dor", disse em entrevista à revista espanhola "Babar", durante as Jornadas Europeias do Livro Infantil e Juvenil (Madrid, 2005).
No livro "A Rainha das Cores" (premiado na Alemanha pela ilustração), uma rainha a preto e branco tem uma grave desavença com a cor amarela, o que levou a uma mistura violenta de todas as cores suas súbditas. Um imenso cinzento acabará por invadir a paisagem e será o choro da monarca que trará a solução ao conflito e levará cada cor a retomar o seu lugar. Mais que um final feliz, dá-nos um desfecho colorido. A autora associa a identificação de cada cor ao reconhecimento que as crianças terão de fazer de si próprias e também à sua aceitação como indivíduos por parte dos pais, ou outros adultos que delas cuidem.
A influência
dos desenhos animados
Há uma simplificação artística nos trabalhos de Jutta Bauer, com a presença de poucos elementos mas cujas formas e posições imprimem um dinamismo muito forte, nalgumas imagens quase hipnótico. Ao leitor chega a dar a sensação de que as figuras se movem de umas páginas para as outras, sobretudo no caso da "Rainha das Cores". Esta técnica obteve-a da experiência de produção de desenhos animados, em que tinha de repetir infinitas vezes a mesma forma mas em atitudes e enquadramentos diferentes, optando assim por reduzir as personagens a traços elementares.
O livro "Quando a Mãe Grita..." surge mais "estático", sendo no entanto muito relevante e eficaz a ligação entre o texto e imagem, como se um não pudesse existir sem o outro. A separação das duas linguagens (a visual e a literária) decerto empobreceria a compreensão e a fruição da narrativa.
Na entrevista à "Babar", revista de literatura infantil e juvenil (http://revistababar.com), Jutta Bauer desmonta o seu método de trabalho: "Às vezes surgem-me primeiro umas palavras que me levam até a uma imagem, ou vice-versa. E assim vai acontecendo até que termino o livro. Até hoje nunca escrevi um texto completo a que tenha juntado logo a ilustração, muito menos o inverso. Nunca de um conjunto de ilustrações me surgiu um texto. Geralmente crio um "story board" como o que se usa para os desenhos animados: numa série de pequenas janelas vou registando a sequência das ilustrações; depois, vou completando à medida que o texto ou outras imagens me vão surgindo. De início, escrevo e desenho tudo muito pequenino e, quando o conjunto está terminado, retoco algumas partes dos dois elementos."
A autora, também cartoonista, nasceu em Hamburgo em 1955 e acredita que "as histórias são como jarros, oferecem uma forma, mas todos os leitores - pouco importa se novos ou velhos - os enchem com as suas próprias experiências e histórias pessoais".
Com os pinguins, há de novo um conflito que se resolve: "A mãe, depois de ter gritado, tinha ido ao encontro de cada parte de mim e, com paciência, linha e agulha, já tinha unido quase todas, só faltavam as pernas." Por fim, disse a palavra mágica que nem todos os adultos conhecem: "Desculpa.""